Encrespando

"Encrespar", na minha terra, dá a ideia de incômodo, de indignação, de alguém que deu um salto de seu lugar de conforto por algo que o incomodou. Já "alisar" é usado com a conotação de quando alguém é condescendente com algo.
Encrespo e não aliso! é um blog feito para relatar o incômodo do racismo em nossa sociedade, especialmente manifesto pela mídia e literatura voltadas ao público infantil. Sem condescendências.
Minha filha me ensinou, desde seus primeiros movimentos, a concentrar a energia de criação e a buscar a gênese. Sim, pretensiosamente, hoje, tenho um alvo mais profundo que as raízes do racismo: a sua semente. Para que não fecunde os corações das novas pessoas, dessas crianças que são nossos filhos e filhas; para que não dê mais frutos, aquelas sementes não podem mais encontrar solos férteis para renascerem racismos no mundo.
Estou mais silenciosa, mas a mente fervilha, tendo em sua grande tela a imagem de um jardim de flores multicoloridas.

terça-feira, 13 de março de 2012

Só os brancos nascem?

(março de 2012) Esta é edição deste mês de março, 2012, da Revista Pais & Filhos, Editora Manchete. Feita em São Paulo, tem circulação e renome nacional nesta área de cuidado infantil, ao lado da Revista Crescer. Fofinho, não? Aliás, todas as crianças são fofíssimas, despertando aquela vontade de encher de cheiro aquela bolinha rosa, loira e de olhos azuis. Ops...como assim? É, então, amig@s. Algo muito simples: para a Revista Pais & Filhos, só os brancos nascem, e preferencialmente os brancos loiros e de olhos claros. Só as crianças brancas são fofinhas. Num país em que @s negr@s são, pelo menos, 51% da população, nenhuma fofinha criança negra - nenhumazinha - recebeu espaço de capa da Pais & Filhos no tempo de um ano inteiro. Mostro a vocês aqui, retrospectivamente, as capas de março de 2012 a março de 2011 - 13 edições completamente brancas. Para um país 100% branco talvez - reforço, talvez - isso não fosse tão indecente.
(fevereiro de 2012) Acontece que somos um país de maioria negra. Em alguns estados, a população negra é até pequena; em outros, predominante. Negras e negros de várias tonalidades, vários tipos corporais, diversas etnicidades; cabelo pixaim, enrolado, misturado, nariz mais largo ou mais fino, negritudes diversas que no entanto são reconhecidas socialmente pela sua matriz africana e toda a história que comporta o corpo negro. Essa história indesejável, para a matriz europeia, tem sido constantemente relegada ao esquecimento das páginas escritas - mas não é esquecida de nenhum modo: porque, se não nas páginas dos historiadores clássicos, no corpo das pessoas que a carrega. Por isso o corpo d@ negr@ é tão negado, invisibilizado. Porque conta uma história indesejável a uma ideologia hegemonicamente branca.
(janeiro de 2012). E se tem algo que a história negra carrega é acerca do fundamento da família. A família, nos sentidos afro-brasileiros (assim como nos povos nativos), é quem sustenta, congrega, fortalece, permite existir e resistir. A mãe que conduz os filhos, pelejando duramente para garantir suas vidas neste mundo sob leis humanas tão desumanas, é a mulher negra que centraliza a força da casa, do terreiro, da comunidade. Se não é mãe de sangue, é mãe-madrinha, mãe-de-santo, mãe-vó. A família, para os povos negros, tem a força da origem e da continuidade. É o espaço em si de guarnição - espiritual e social. Daí que se formam quilombos: numa casa ou numa rua, mães, tias, avós, irmãos, primos e primas se aquilombam, sem a classificação dicotômica de "família nuclear" e "família extensa", comum à família da cultura burguesa.
(edições de dezembro a setembro de 2011) Por que não temos imagens de crianças negras em um ano de edições da Revista Pais & Filhos? Porque pais, mães e filhos e filhas negr@s não interessam à revista. Ela simplesmente assume o padrão racista do branco desejável, negando terminantemente a negritude brasileira. O maior problema dessa postura racista é que perpetua a negação da família negra aos olhos da sociedade em geral. Primeiramente, impõe uma imagem familiar que exclui os pais e filhos negros; nega, portanto, às mães negras (porque às mães é destinada a revista, apesar do título) se sentirem parte de uma dimensão materna - o cuidado infantil. Consequentemente, nega aos bebês negros o direito de pertencerem a este universo dos anjinhos, dos serezinhos que devem receber cuidados e mimos especiais.
(edições de agosto a abril de 2011) Bem, está chegando a hora de preparar o almoço. Deixo vocês, leitoras e leitores, com estas imagens e algumas reflexões. Em um ano apenas de publicação, o que somente uma revista de maternagem e cuidado infantil foi capaz de semear? Não vejo bons frutos nisto. Abaixo, a mais nórdica das capas do universo desta breve pesquisa, publicada no mês de março de 2011.
Luther King, dá uma dica a mais de como realizar teu sonho!

20 comentários:

  1. Que vergonha! Devemos boicotar esta revista!
    Daniel - Unicamp

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    1. Pois é, Daniel...eu acredito sim que devemos fazer crescer a política do boicote. Esses e outros produtos não deveriam ser consumidos por quem quer uma sociedade justa e igualitária.

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  2. Nossa, que incrivel. Há mais ou menos um ano questionei publicamente a revista, atraves de emails e twitter, o pqdo nao reconhecimento, por parte da revista, de nosso multiculturalismo. Perguntei se havia alguma orientação editorial para que somente crianças brancas aparecessem na revista. Obviamente, responderam que não, mas que ficariam atentos. Tenho a assinatura da revista e nada mudou. Paraéns pela iniciativa, me deu a ideia de voltar a cutucar a revista. Araços.

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  3. Acredito que a questão não é boicotar a revista e sim mostrar a ela que a diversidade racial existe!! este modelo europeu que a nossa sociedade sustenta a mais de 500 anos não vai mudar se todos nós não tomarmos consciencia do que verdadeiramente somos, esta mistura de várias etnias. Só crianças brancas na capa destas revistas não pode representar um país onde 56% da populaçaõ é negra e afrodescendente, mas elas representam o quanto ainda temos que lutar para que mudanças sejam feitas.

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    1. Poxa, Surama, entendo o que você diz...mas será que as pessoas que fazem a revista não sabem mesmo que existe diversidade racial? Infelizmente, eu acredito que sabem. E que não colocam crianças negras nas capas por racismo mesmo. Infelizmente. Mas concordo que devemos pelejar pelas mudanças! E unidos faremos melhor, com certeza.

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  4. O interessante é que o fato de não trazer crianças negras na capa não diminui o público da revista, a publicação não recebe cartas de protesto em relação ao assunto e seus anunciantes não sofrem nenhuma represália por anunciarem numa revista racista. é o mesmo q nas novelas. todo mundo reclama q não há negros, porém, ninguém perde sequer um capítulo.

    racismo cordial, muito cordial.

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    1. Luiz, infelizmente ainda não temos uma cultura de boicote a produtos e empresas racistas e/ou sexistas. Tentamos há um tempo sugerir boicote às cervejarias que usassem mulher pelada na propaganda e tivemos uma apática resposta das pessoas que trabalham contra o machismo, mas que adoram uma cervejinha gelada. A maioria das pessoas, achando que não adianta, se conformam em sua zona de conforto. Mas eu acredito em água mole...

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  5. Apropriadíssima sua observação. É impressionante a "forma de proceder" de editores, diretores, ou quem quer que determine a capa de uma publicação, no caso revistas. Percebo que não existe o menor pudor em excluir as "caras negras". Também acompanhei a publicação de uma revista, a LOLA, lançada a um ano, não mais que isso, também ignora completamente a existência de negros/negras no país. Indignada parei de comprar a dita.
    Parabéns pelo blog e os postes.
    Um abraço. Ana Mota

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    1. É isso, Ana. Não compremos. Quando tive minha filha, fui toda entusiasmada atrás de Pais & Filhos, tb da Crescer. Quando vi as capas e conteúdos, deixei pra lá. Não me interessa quem ignora mais da metade do país. Um abraço.

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  6. QUERIDA REBECA,SÃO PESSOAS COMO CASTRO ALVES,GANDHI,ZUMBI,DR KING,MANDELA E VOCÊ...QUE TORNAM ESTE MUNDO VIVÍVEL,OBRIGADO! HOJE ME OCORREU UM ATO DE INDIGNAÇÃO TAMBÉM,FOI ASSIM,TODOS OS MESES EU FAZIA UMA DOAÇÃO A UMA CRECHE DE CRIÂNÇAS ORFÃS DE GOIÂNIA(CRECHE FRANCISCA DE LIMA),MAS HOJE PERCEBI QUE CHEGUEI NO AUGE DE MINHA MILITÂNCIA,POIS,NO RECIBO QUE EU RECEBIA TODO MÊS NOTEI QUE NÃO HAVIA CRIÂNÇAS NEGRAS,APENAS BRANCAS,A CRECHE FICA EM UMA AREA NOBRE DA CIDADE,LOGO LIGUEI UM FATO A OUTRO E PERCEBI QUE ESTAVA CONTRIBUIDO PARA A MANUTENÇÃO DO RACISMO,ENTÃO,QUANDO A MOÇA ME LIGOU PARA CONFIRMAR A DOAÇÃO DESTE MÊS,EU DISSE A ELA QUE,EU DEIXARIA DE DOAR POIS A CRECHE NÃO RESPEITAVA A DIVERSIDADE NEM MESMO NO RECIBO DE DOAÇÃO E QUE AQUILO ERA UMA REPRESENTAÇÃO DA REALIDADE,ELA SORRIU DO QUE EU DISSE E DISSE,EM TOM SARCASTICO,É BESTEIRA,E CONTINUOU SORRINDO,ENTÃO EU DISSE,POR ESSE MOTIVO NÃO ESTOU MAIS AFIM DE DOAR,ELA SEM DAR MUITA IMPORTÂNCIA DESLIGOU,DEPOIS REFLETI SOBRE O OCORRIDO E CHEGUEI A UMA CONCLUSÃO,(AGORA CHEGUEI NO ESTÁGIO CRÍTICO EM QUE SEMPRE DEVERIA ESTAR),A VOCÊ MEUS SINCEROS AGRADECIMENTOS POIS NÃO SE VÊ VERDADES COMO ESSA EM LUGAR ALGUM...ATE LOGO ABRAÇO.

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    1. Querida(o) 25252525, grata pelo apoio.
      É mesmo bom ter sempre um olhar crítico e desconfiar de quem pede ajuda. E é mesmo estranho que até numa creche se exclua as crianças negras! Muito, muito maluco isso!
      Mas não deixa de auxiliar as criancinhas, tá? Encontre um lugar que vc confia e continue seu ato de carinho, que é sempre bom. Abraço!

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    2. Boicotar! E até o acesso ao site. Isso eles irão entender.

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    3. Então vamos, Mara, boicotar. Será legal tb quando enchermos a caixa de mensagem deles com nosso protesto!

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  7. Este comentário foi removido pelo autor.

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  8. Sou moreno e também não fui representado (apesar que nasci loiro de olhos escuros, mas a natureza tingiu meu cabelo, dando um contraste com a pele). Eles parecem ter algo contra qualquer bb que não seja loiro de olhos azuis. Pouquíssimas pessoas no Brasil atendem esse padrão tão fascista. Esta revista conseguiu fazer pior que a Rede Globo.

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